Esse preâmbulo é para voltar à questão do reajuste dos professores quando o “bom moço” também perdeu as estribeiras, assim como na Vila do Pará, e, segundo foi divulgado nas redes sociais, ao ouvir de um professor o termo ”indecente” para a proposta de reajuste zero oferecida pelo prefeito, este teria apontado o dedo na direção do rosto do professor, exigindo respeito. Agora, dimensionemos o peso dos termos “indecente” e “canalhas” e consideremos o contexto em que foram verbalizados. Contra o administrador do município acrescente-se a condução que deu às negociações, chegando inclusive a desmarcar uma reunião por se sentir “ameaçado” com a presença de muitos professores no encontro de negociação salarial.
Adicione-se o ingrediente rasteiro do “monge Rasputin” de tentar constranger a categoria por supostamente receber altos salários, desconsiderando o tempo de serviço e a qualificação do professor, sua árdua jornada diária que não se resume a entrar numa sala de aula e expor o conteúdo, que é a parte mais fácil da rotina, a menos estressante, a menos trabalhosa, mas, principalmente, enfrentar toda a complexidade de uma concentração com 20, 30, 40 alunos, suas condições sociais, o desafio da indisciplina, a concorrência dos eletrônicos, especialmente do celular, que está para o aprendizado assim como a Coca-Cola está para a alimentação saudável; a promessa em campanha de cumprir integralmente as determinações da lei que garante o reajuste anual dos salários; a saúde financeira da prefeitura, tão alardeada pelos simpatizantes do auto-proclamado NOVO TEMPO, com a Caixa dispensando a astronômica soma de 120 milhões em créditos. Em favor do professor o desconto de se sentir indignado e ultrajado com o “zero” de reajuste, ou seja, receber um salário menor, já que corroído pela inflação.
Exaustos e optando pela redução de danos, restou aos professores aceitar a proposta inicial do prefeito de “reajuste zero”, porque os primeiros centavos dos 15% definidos pelo MEC só entrarão na conta do professor nos primeiros dias de 2024, sem retroagir à data legal que seria primeiro de janeiro de 2023. E uma segunda parte em julho de 2024. Sendo assim, no momento em que os professores já deveriam estar recebendo o reajuste do ano que vem, estarão recebendo a segunda metade do reajuste desse ano. Sua excelência prefeito Fábio Aragão aviltou a promessa do então candidato Fábio Aragão. Pior, ”cozinhou” os professores desde o início, foi à justiça e esta, não só concordou com o “bom moço” (não fez a canalhice de não atender o pleito jurídico do prefeito), como ainda lançou uma dúvida acerca da legalidade do reajuste anualmente determinado pelo MEC. Tem ainda a ameaça de desmontar o plano de cargos e carreiras do magistério municipal que, como em todo lugar, sempre é fruto de uma sofrida luta, de anos, e que agora pode ser aniquilado por aqueles que querem que todos os profissionais recebam o piso determinado pelo MEC, independente de ter 3, 10 ou 20 anos de trabalho, independente de ser graduado, especialista, mestre ou doutor. Aliás, quem tiver mestrado e doutorado, procure uma universidade para lecionar, segundo o pensamento da gestão municipal, uma vez que o ensino fundamental não é para mestres e doutores. Os professores de Santa Cruz receberam uma “imposição indecente” e dessa obra o prefeito Fábio pode se orgulhar: “reajuste zero” em 2023. Os professores perderam a batalha na administração e na justiça, mas há ainda uma instância a recorrer e o juiz é o próprio professor e seu potencial de luta..
Gisonaldo Grangeiro, "cearense" de Pernambuco, agrestino do Polo, professor efetivo da Rede Estadual de Educação do Estado do Ceará e da Rede Municipal de Educação de Fortaleza.