Considerando o quadro do momento, a eleição em
Santa Cruz do Capibaribe vai deixar questões fundamentais como saúde, educação,
limpeza urbana, pavimentação de ruas, saneamento, habitação, em plano
secundário, e vai debater quem é mais cristão, quem é comunista, quem é
negacionista, quem é ladrão, quem é miliciano, quem é de família e por aí vai.
Se na Paraíba um time de futebol teve a infeliz coincidência de perder um
título estadual logo após o ex-presidente Jair Bolsonaro vestir sua camisa e
virar chacota nas redes sociais por causa de um suposto pé frio do
ex-presidente, na terra da confecção o fenômeno é o inverso, há uma briga
política para ver quem vai seduzir Bolsonaro a vestir a camisa de seu
respectivo grupo político.
Tudo isso porque a cidade seria "bolsonarista",
levando em conta o resultado da ultima eleição presidencial. A preço de hoje,
considerando o potencial competitivo, teremos três opções para a escolha do
eleitorado, duas delas se digladiando para ver quem mais expõe um suposto apoio
do ex-presidente e sua digníssima e uma
terceira passando um recibo de que ele é muito forte e não convém que se
transforme em pauta para a eleição municipal. Ou seja, ao fugir da
nacionalização, termina endossando a expectativa das duas concorrentes, numa
espécie de retroalimentação.
O grupo Azul fez um grande movimento político
no tabuleiro eleitoral ao fisgar o controle do PL, partido do ex-presidente.
Pareceu um xeque-mate político, evidenciando a habilidade do seu líder,
deputado Edson Vieira. Como a cidade é "bolsonarista", o apoio do
ex-presidente e de seu partido seria o grande trunfo para o grupo retomar a
posse da cadeira número 1 da municipalidade. Ainda no clima de euforia, pareceu
que uma junção de toda a oposição seria alcançável para derrotar o inimigo em
comum, o prefeito Fábio. Com a jogada, no mínimo, o grupo se cacifaria para
polarizar com o prefeito, deixando a incômoda terceira posição em que terminou
em 2020. Mas, até o momento, passado o calor da conquista, o grupo deve uma
prova inequívoca de que vai representar integralmente o bolsonarismo na cidade,
incluindo manifestações inequívocas de caciques como o ex-casal presidencial e
o ex-candidato ao senado, Gilson Machado. Manifestações inequívocas incluem
também que esses personagens graúdos desautorizem que outro pré-candidato use
seus nomes na pré-campanha.
Já no grupo Verde, barriga de aluguel
do empresário Robson Ferreira, a tônica é a de que o verdadeiro bolsonarismo da
cidade é representado por ele e mais ninguém, portanto, os personagens azuis
nada mais seriam do que “melancias brancas” querendo chegar à mesa do eleitor pegando
carona no pé quente do voto e das motociatas. O “Lombardi” acredita que é ele
quem tem prestígio “lá em cima”. O curioso é que Robson saiu do PL, partido do ex-presidente,
onde Adilson do Jerimum não deixou que ele fosse sequer vogal da legenda e se
abrigou no PP, para continuar alegando suposto prestígio com Bolsonaro.
Conversa que faz algum sentido até que o deputado estadual e o sanfoneiro o
desautorizem veementemente. Não vale a palavra do presidente estadual do PL ou
do deputado estadual Abimael enquanto não imprimir bem legível para Robson que
o coração de Bolsonaro estará com o casal do grupo azul. Agora, Lombardi
precisa demonstrar também que não é um bolsonarista enxerido; que tem uma foto
com o ex-presidente para apresentar, mesmo que seja na correria de um bandejão.
Já está quase consolidada a possibilidade de dupla candidatura da oposição,
imaginem se essas duas candidaturas se engalfinharem para ver quem vai ser o
“Sebastião” da marca Bolsonaro.
Favorito pela vantagem de estar com a
máquina da prefeitura na mão e, ninguém duvida, por não ter uma imagem negativa
perante o eleitorado (não confundir com se fez obra ou se não fez obra), o
prefeito Fábio Aragão (bolsonarista, segundo o senso comum nunca negado) também
quer o pé quente do ex-presidente, mas ao estilo Ciro Gomes, escondido do
eleitor (ex-ministro queria que o PT não tivesse candidato em 2018 e não
declarasse em público o apoio a ele). A diferença é que a Federação
(PT-PCdoB-PV) “não vai existir” nesse pleito de outubro próximo. Segundo as más
línguas (também não questionadas), esses partidos estão muito associados ao
lulismo e, portanto, numa cidade bolsonarista, seria um risco eleitoral tê-los
na coligação para a disputa com a oposição. Juntando outros sinais, como militantes
históricos da esquerda se filiando a partidos de centro-direita para poder
estar na cédula eleitoral ou o prefeito Fábio não dirigir uma palavra de
agradecimento político ao presidente Lula pela conquista “histórica” do
Instituto Federal para a cidade, corrobora-se essa estratégia do prefeito.
Evidentemente que não se faz aqui um
julgamento de quem está certo ou errado, quem está sendo coerente ou não, justo
ou não. Cada um faz sua aposta ou no bolsonarismo explícito ou no bolsonarismo
acanhado. Mas o fato é que ao prefeito não interessa nacionalizar e sim ficar
no camarote vendo a oposição se dividir para perder. E esta trocando caneladas
pela posse da figura do ex-presidente. Oficial e explicitamente, o PL,
portanto, Bolsonaro, está com os azuis. Mas Robson não arrefece, nem é
desencorajado. Quem levar, não vai ser de porteira fechada. Mais um motivo para
o prefeito se preparar para o principal prêmio de uma gestão, ser reconduzido
ao cargo, para, quem sabe, ter tempo de entregar a primeira obra tão cobrada
pela oposição. O eleitor, porém, não vai poder cobrar a primeira obra do
bolsonarismo, porque não tem.
Gisonaldo Grangeiro, "cearense" de Pernambuco, agrestino do Polo, professor efetivo da Rede Estadual de Educação do Estado do Ceará e da Rede Municipal de Educação de Fortaleza.