Mais um episódio inesperado para a coleção do prefeito Fábio Aragão na saga do empréstimo solicitado à Câmara Municipal de Santa Cruz para a construção do hospital Fernando Aragão. Depois de ter “paralisado” o processo na casa legislativa, na primeira votação, lá em abril, através de uma ação na Justiça, inconformado com o prazo dado pelos parlamentares, 36 meses no lugar do eterno 120 meses, e surpreso com o “SIM” de todos os vereadores, voltou agora o prefeito, com nova decisão judicial, supondo, mais uma vez, que daria um xeque-mate na bancada de oposição. Por determinação judicial, ou a Câmara votava o empréstimo ou a pauta ficaria “trancada” impedindo outras votações. E o prefeito e seu “primeiro ministro” tiveram o que tanto queriam, a matéria foi submetida à nova votação e, ignorando a “faca nos peitos”, os vereadores, corajosamente, rejeitaram o pedido de empréstimo. Ou seja, saltitando de alegria com a liminar da Justiça, o grupo de situação pensava que colocaria a bancada de oposição contra a parede para votar outro pedido de empréstimo, mas foi surpreendido com a decisão do presidente da Câmara de pautar o empréstimo do hospital. Zonza com a manobra, a bancada do prefeito pediu vistas do projeto de empréstimo para pavimentação de ruas, temendo uma nova derrota e ganhando tempo para encontrar uma forma de arrancar da Câmara uma autorização para endividar o município, sem compartilhar com os vereadores as informações cruciais para que eles formem suas opiniões e possam cumprir seu papel de legisladores.
Desde o início que o expediente político do grupo de situação é constranger os “contras”, fazendo a política fácil e demagógica do “quem não for a favor é porque tem plano de saúde e é contra a população, ou está tirando proveito político com o transporte de pacientes para Campina Grande”. Usando o mesmo oportunismo político, poder-se-ia dizer que o prefeito é contra a população porque em 30 meses de gestão, não realizou uma simples cirurgia de extração de unha encravada? Poder-se-ia dizer que a secretária de saúde é contra as mulheres ao não adquirir um mamógrafo com o recurso que recebeu de uma emenda parlamentar? Um projeto da magnitude de um hospital demandaria de um gestor uma postura de “estadista”, convocando a todos, situação, oposição, população, para expor com clareza os detalhes do projeto, sua importância, seus custos, suas alternativas de financiamento, os meios para prover o seu custeio, depois de construído, etc.
Mas, para isso, ficaria na sinuca de bico de detalhar o orçamento, ou seja, de mostrar por que a folha de pessoal passou dos 60%, 12 pontos percentuais acima dos 48% prometidos em campanha eleitoral. Promessa que certamente recebeu o crédito do eleitor e, passados mais da metade do mandato, vê-se agora que foi um engodo, uma estratégia eleitoral, como tantos outros registrados em áudios e vídeos. Evidente que um prefeito não implementa tudo o que promete, mas faz um esforço nessa direção, para mostrar à população que oferecera algo concreto e possível. E, no caso do hospital, o esforço do prefeito é jogar a população contra qualquer vereador que questione os pedidos de empréstimos, mesmo que isso seja, não só um direito de um parlamentar de oposição, como uma obrigação, com a lei e com quem lhe confiou um voto.
Mas, justiça seja feita, parece já haver, da parte do prefeito, uma mudança de atitude, se tomarmos como verdadeiros, os “sinais” soprados na mídia e redes sociais, dando conta de que o gestor pepista teria um “plano B”. Seria um atestado aos vereadores de oposição de que há alternativas ao endividamento da prefeitura, cujos efeitos se prolongariam por 120 meses, o prazo que o prefeito quer, numa lógica que contraria a postura de um tomador de empréstimo: por que vou pagar em dez anos aquilo que a Caixa diz que posso pagar em três? Além disso, conforme “recibo passado” pelo vereador Carlinhos, no seu programa do último sábado, o prefeito teria pedido para ”maneirar” na relação com os vereadores de oposição. Uma dupla sinalização do chefe Taboquinha. Certamente de estar constrangido com a agressividade verbal do seu aliado e possivelmente aposte numa relação amistosa, daqui para a frente, com a Câmara Municipal.
Carão ou súplica, não vem ao caso, o fato é que, muito contrariado, o vereador voltou a falar na “peruca do Zeba”, na roupa íntima de uma vereadora, num curso superior que esta pagou para seu filho, assuntos particulares, que só entram no debate quando não se doma a cólera pessoal advinda das derrotas políticas. Além disso, se foi “carão”, o vereador fez pouco caso da “autoridade” do prefeito; se foi “súplica”, desconsiderou-lhe. Salutar e normal a disputa política, mas há um limite que não pode ser ultrapassado. Os vereadores têm a mesma legitimidade do prefeito e podem estar fazendo agora o papel que o então candidato Fábio fez quando se apresentou ao eleitor: oposição. A promessa é fácil e saborosa, mas quando o imponderável transforma uma improbabilidade em realidade, o sortudo vai ter o bônus e o ônus, a tempestade e a bonança.
Gisonaldo Grangeiro, "cearense" de Pernambuco, agrestino do Polo, professor efetivo da Rede Estadual de Educação do Estado do Ceará e da Rede Municipal de Educação de Fortaleza.