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sexta-feira, 12 de julho de 2024

Cassação de Capilé: indevido processo legal


 Quem imaginaria que a sessão extraordinária da Câmara Municipal de Santa Cruz do Capibaribe, do dia 20 de junho, cuja pauta principal foi “assuntos correlatos a cassação do Vereador Cícero Cosme da Silva, bem como dos atos do presidente” terminaria, não só com a anulação da cassação aprovada no dia 13 de junho, como também na própria anulação de todo o processo? Tudo isso sem que o vereador Carlinhos da Cohab fosse na jugular de qualquer vereador, Vermelho ou Azul. Nem parecia aquele Carlinhos que “metralhou” a “farra do Take” promovida pelo presidente Zeba, acompanhado de muitos dos que guilhotinaram, irregularmente, o mandato do vereador Capilé, regada a Old Par e queijo provolone, segundo Carlinhos. Aliás, a tabelinha Nailson Ramos, Jessyca Cavalcante e Gilson Julião com Carlinhos da Cohab, no dia 20, parecia uma tão falada junção de cores políticas, tamanha a sintonia e o enlace político. Por pouco não surgiu o grupo roxo.

       Antes da sessão começar, já corria nos blogs de notícias e nas redes sociais que o presidente Zeba seria destituído do cargo por causa dos “atos” do dia 18 de junho, quando anulou a sessão de cassação do dia 13 de junho. Ou seja, alguém do grupo dos quatorze vereadores que iriam reconhecer a ilegalidade da cassação, por flagrante desrespeito ao devido processo legal e à ampla defesa, já antecipava à imprensa que destituiriam o presidente por supostamente ter infringido o regimento interno da casa, como também desrespeitado a “soberania do plenário”. Plenário este, cujos vereadores tiveram 60 dias para elaborar e votar um relatório sobre o resultado incontestável apurado pela CPI da reforma do plenário e deixaram para fazê-lo no último dia do prazo, como se a cassação do mandato de um vereador fosse um mero requerimento. A soberania  do plenário, reconhecidamente ilegal pelos próprios quatorze vereadores, não se sobrepõe à soberania do voto e, principalmente, à soberania da lei.

         Já no dia 13 de junho, o presidente Zeba alertou sobre a irregularidade de continuar a sessão extraordinária, pois o devido processo legal e a ampla defesa não foram garantidos ao vereador Capilé. Fez uma exposição endossada em parecer jurídico, disse que não presidiria a sessão e retirou-se do plenário. Mesmo assim, o grupo dos quatorze vereadores dos grupos Vermelho e Azul ignorou os alertas do presidente e resolveram continuar a sessão que resultou na cassação do parlamentar em questão. Lembrando que dentro do grupo há três advogados, um dos quais já presidiu a casa, portanto, dispunham de notória experiência para não consumar o ato que, sete dias depois, o mesmo grupo, com os mesmos três advogados, consideraria irregular, dando uma certidão positiva ao que o presidente Zeba falou no dia 13.

          O ato do presidente, no dia 18 de junho, anulando a sessão de cassação do vereador, mesmo com o respaldo jurídico da casa, é questionável. Pode-se sim acusá-lo de descumprir o regimento. Mas tal iniciativa não se assemelha ao ato dos quatorze vereadores, reconhecido por eles mesmos, qual seja, negar ao vereador Capilé princípios sagrados de uma democracia: devido processo legal e direito à ampla defesa e ao contraditório. Princípios estes inscritos e garantidos na lei Magna do país, a Constituição. Então, se nessa mesma sessão em que o grupo de quatorze vereadores reconheceu que as leis de garantias fundamentais não foram cumpridas no processo de cassação, também foi deliberado o afastamento do presidente para posteriormente ser destituído, como punição à suposta infração do regimento, qual seriam as consequências jurídicas para esse grupo de vereadores que feriram a Constituição? E nem precisaram ser questionados pelo vereador cassado. Cuidaram eles próprios de registrar nos arquivos da casa, na sessão do dia 20, que realizaram uma sessão irregular. Mesmo assim, contrariados com o presidente,  ainda iniciaram o processo de destituição do presidente Zeba.

       O roteiro do dia 20 pareceu ensaiado, tamanha a harmonia e sintonia entre os vereadores. Um deles pediu a abertura do processo de destituição do presidente, que foi acusado inclusive de agir para proteger um colega de grupo, no caso, o vereador Capilé. Nada mais pueril o presidente proteger Capilé dispondo de três votos contra quatorze dos grupos Vermelho e Azul. Ora, se foi assim, se zeba tentou proteger o colega de grupo, poder-se-ia dizer que os quatorze, como adversários, agiram para perseguir? È preciso alinhar certas teses para que não se assemelhem ao cinismo. Nada há em todo esse processo que configure uma atitude protelatória do presidente Zeba ou que tenha procurado dificultar a investigação ou a confecção e votação do relatório no conselho de ética. Tudo o que aconteceu, a partir do primeiro dia do prazo de sessenta dias que tiveram é responsabilidade exclusiva dos quatorze vereadores que votaram naquela sessão do dia 13.Tudo o mais foi consequência, inclusive os posteriores “atos do presidente”. ´

       A pressa de votar o parecer da comissão de ética, para que não fosse prejudicado com a exiguidade do tempo, protelado pelo mesmo grupo dos quatorze vereadores, terminou resultando no que queriam evitar. Ou seja, voltou tudo à estaca zero, tudo será reiniciado, agora cuidando em garantir ao vereador a ampla defesa e sem “atropelos” como destacou o vereador, advogado e ex-presidente Augusto Maia. Os lamentos da sessão do dia 13, onde todos expuseram a dor em ter de cassar o mandato de um colega, vão dar lugar agora ao mesmo sentimento de um felino espreitando a presa. Fizeram a lambança e estão contrariados com quem colocou o dedo na ferida. Nada podem dizer porque está tudo atestado na ata do dia 20. Se a Justiça não repuser as coisas no seu devido lugar, que a soberania do voto e das urnas o façam. Estão misturando atos legislativos com cores partidárias para justificar, proximamente, a cassação do vereador e a destituição do presidente.

           O poder legislativo é, naturalmente, mais exposto à crítica do “não faz nada”. Crítica essa endossada até por quem entende o papel de um vereador, que não tem nada a ver com “fazer”, e sim legislar e fiscalizar o executivo. A população não compreende bem a importância de um parlamentar. Deve ser por isso que muitas vezes se veem casas legislativas “jogando para a plateia”, com receio de serem mal vistas se seguirem os ditames legais. Não há ninguém que conteste a robustez do relatório da CPI e do parecer da comissão de ética. Mas não é isso que está em questão. O “julgador” não pode usar expedientes questionáveis, e nesse caso, reconhecido por ele próprio. Mesmo que a culpa seja óbvia, o processo tem de seguir o que determinam as leis, sem “atropelos”, mesmo que o fígado político implore por uma catarse. Mesmo que o vereador acusado não tenha sido diligente com seu mandato. Os sinais de “atropelos” são evidentes, que o vereador Capilé e o presidente Zeba busquem a mediação judicial. Isso também é democracia. Acomodar ou capitular cria uma “jurisprudência” para legitimar futuros contrariados.

 Gisonaldo Grangeiro, "cearense" de Pernambuco, agrestino do Polo, professor efetivo da Rede Estadual de Educação do Estado do Ceará e da Rede Municipal de Educação de Fortaleza.

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