O Governo Federal vai investir recursos da Lei Rouanet, criada para apoiar a cultura, em eventos de armas de fogo.
André Porciuncula, secretário nacional de Incentivo e Fomento à Cultura confirmou a novidade. "Pela primeira vez vamos colocar dinheiro da Rouanet em eventos de arma de fogo, vai ser super bacana isso”, disse.
A promessa foi feita durante a Convenção Nacional Pró-armas, realizada no dia 28 de março deste ano, quando ele ainda ocupava o segundo cargo mais importante da Cultura no país (dias depois, deixou o posto com a intenção de se lançar candidato a deputado federal).
Segundo Porciuncula, o governo tem R$ 1,2 bilhão para dois “megaeventos”, dinheiro que pode ser usado, segundo ele, por criadores de conteúdos pró-armas. A referência, no caso, seriam as comemorações do Bicentenário da Independência do Brasil, que será celebrado em setembro deste ano — um mês antes das eleições.
Oficialmente, a Secretaria de Cultura anunciou um edital de R$ 30 milhões para produções audiovisuais sobre o bicentenário. Segundo o texto, podem ser documentários, filmes de ficção ou animações de curta e longa metragem que tenham o tema da independência. A Agência Pública questionou a pasta sobre o financiamento de R$ 1,2 bilhão prometido pelo ex-secretário, que ainda não retornou.
Criticada por Bolsonaro, Lei Rouanet é indicada para produção de conteúdos pró-armas
“Eu comando a famosa Lei Rouanet, aquela leizinha sem polêmica nenhuma”, ironizou o então secretário Nacional de Incentivo e Fomento à Cultura ao se apresentar no evento pró-armas. Capitão da Polícia Militar da Bahia, ele ficou conhecido como “Capitão Cultura” e já afirmou em entrevista que “a Lei Rouanet não pode financiar eventos políticos”.
Fã de Jair Bolsonaro, André Porciuncula, que foi nomeado ao cargo em setembro de 2020, afirma que chegou lá graças ao presidente. “O presidente me trouxe para dar um choque de gestão. Ter a coragem de fazer o que é certo”, disse. Jair e o filho, Eduardo Bolsonaro, estiveram ao lado do PM agora em março, quando ele assinou sua filiação ao PL e anunciou sua pré-candidatura a deputado federal pela Bahia.
Porciuncula discursou após o então chefe, o secretário de Cultura Mário Frias. Ambos deixaram os cargos para concorrer às eleições neste ano pelo partido de Bolsonaro, o Partido Liberal (PL). Frias foi exonerado no dia 30 de março e Porciuncula, no dia 31, após o evento pró-armas no qual prometeu as verbas da Rouanet.
Frias começou sua fala justificando que convidou Porciuncula para ser seu braço-direito na secretaria porque “a Rouanet era um caso de polícia”. “Então nada melhor do que ter um capitão da PM comigo na trincheira”, destacou.
Assim como Porciuncula, Frias defendeu ao longo do evento a criação de obras audiovisuais voltadas ao movimento armamentista.
O ex-secretário deu como exemplo o filme Tropa de Elite, do diretor José Padilha. “Todos nós vimos Tropa de Elite, será que aquilo se agarrou no imaginário comum das pessoas, da população brasileira? Nós elegemos um capitão, tem tudo a ver uma coisa com a outra”, ressaltou.
A “estratégia”, segundo Porciuncula, é agir dentro do imaginário coletivo para que a população mude a percepção e apoie a pauta do armamento. Para isso, ele diz ter colocado a equipe e os recursos da Secretaria da Cultura à disposição de armamentistas, apesar de precisar deixar a secretaria para concorrer às eleições.
A Agência Pública enviou questionamentos à Secretaria de Cultura sobre as falas dos então secretários, mas ainda não recebeu resposta.
Chamada de "desgraça" por Bolsonaro, a Lei Rouanet é alvo constante de críticas por apoiadores do presidente. Em fevereiro deste ano, a Secretaria de Cultura, ainda comandada por Mário Frias, alterou regras da Rouanet. Segundo divulgado pelo governo, a lei reduziu o teto de projetos apoiados de R$ 1 milhão para R$ 500 mil, o de artistas para R$ 3 mil para cada projeto aprovado e o aluguel de teatro para R$ 10 mil.
Dentre as justificativas para produzir conteúdos audiovisuais pró-armas, Porciuncula cita que elas seriam uma ferramenta para combater “crimes” do Estado, fazendo alusão a medidas impostas durante a pandemia de covid-19 para conter a disseminação do coronavírus.
No evento, Frias também criticou medidas de restrição impostas a nível estadual e municipal. “Assistimos, nós da Secretaria, muito aterrorizados com a postura de governadores e prefeitos em simplesmente trancarem a população dentro de casa sem pensar em como seria a subsistência dessas pessoas sem seu trabalho”, disse.
As falas de Frias e Porciuncula vão ao encontro do que o próprio presidente disse na reunião ministerial ocorrida a portas fechadas em abril de 2020, e divulgada posteriormente por decisão do ministro Celso de Mello, do Supremo Tribunal Federal. Na época, Bolsonaro defendeu que a população civil armada não precisaria ficar em casa por decretos de prefeitos.
*Com informações do site Brasil de Fato.
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