Se fosse um paciente, o hospital Fernando Aragão precisaria apenas de uma consulta num posto médico, com um clínico geral, que lhe receitaria uma medicação simples, repouso e alguns dias para que a enfermidade fosse debelada. Mas, se o clínico geral fosse o vereador Carlinhos da Cohab ou o prefeito Fábio Aragão, internação urgente num desses hospitais fora de Santa Cruz ( a capital da sulanca, com seus mais de 100 mil habitantes, não tem equipamento médico para uma simples cirurgia). Entretanto, e se o outro médico dissesse: “um posto de saúde resolve”? Os clínicos supracitados diriam: “não, vamos levar para Queimadas, Agrestina ou qualquer cidade que tenha contraído um empréstimo do FINISA”.
O parágrafo acima substituiria essa novela mexicana criada pelo prefeito de Santa Cruz sobre a tomada de um empréstimo da Caixa Econômica para construir o hospital Fernando Aragão. O posto de saúde seria o prazo de 36 meses para pagar o financiamento, o clínico geral seria o técnico da Caixa que fez um estudo garantindo que a prefeitura tem capacidade financeira para contrair um empréstimo de até 120 milhões, podendo pagar mensalmente uma prestação de até 5 milhões. Todavia, os dois clínicos querem a “internação” no hospital de 120 meses, ou seja, construir um equipamento e pagar dois.
Desde o início dessa história,nas redes sociais, nos blogs, nos sites, a cantiga do prefeito, da sua bancada e dos seus apoiadores e simpatizantes era uma só: faca no pescoço da oposição. Começando com a campanha massiva e sofisticada, na mídia e nas ruas, do polêmico hospital, como se fossem favas contadas. Para qualquer questionamento, que é direito de qualquer cidadão, que é uma obrigação dos vereadores, lá vinha o carimbo: é CONTRA a cidade, contra a população, contra a saúde. Até que chegou a hora da audiência pública e da votação da mensagem na Câmara para mostrar que ninguém na cidade ou na região se opõe a que Santa Cruz tenha um hospital para atender dignamente os seus moradores, sem precisar transportá-los para outras cidades.
Matéria de tamanha importância exige pactuação com todas as forças políticas da cidade e não criar antecipadamente um clima de chantagem, chegando até ao expediente de convocar a prefeita de uma cidade vizinha para constranger os vereadores de oposição. E, na hora H, quem botou o dedo no suspiro, quem abortou a votação, quem impediu a aprovação do financiamento? Um vereador da bancada do prefeito. Não poderia haver uma conversa para se chegar a um acordo, antes de, outra vez, “ameaçar” os vereadores com a promessa de recorrer à Justiça? Possivelmente o prefeito, ao dizer que o prazo de 36 meses inviabilizaria as ações da prefeitura em outras áreas da administração, passaria o constrangimento de ser lembrado de que a Caixa, que foi o suporte da prefeitura para emparedar os vereadores, também disse que o município tem capacidade de pagamento para liquidar o financiamento muito antes dos 120 meses que o prefeito quer impor, evitando assim, fazer um e pagar dois.
Aguardemos então o curso do rio, se vai para o fórum ou se volta para a Câmara Municipal, o lugar adequado para as ponderações razoáveis que resultam em “consensos” cujos fins, acreditamos, seja, não só o bem da população, mas também uma responsabilidade da gestão dos recursos públicos, sem comprometer o presente e o futuro dos santacruzenses, dentro dos princípios da transparência e economicidade. O prefeito queria o dinheiro, a Câmara iria dar. 36 meses é pouco? 120 meses é muito? Chamem a Caixa, porque, quem empresta, confia. Não foi ela o escudo da prefeitura na audiência pública?
Este “paciente”, hospital Fernando Aragão, bonito e saudável nos outdoors espalhados pela cidade, precisa nascer, e, por enquanto, não pode ser no Raimundo Aragão, porque o bloco cirúrgico está fechado, nem no hospital do doutor Silvano, porque é “caro”.
Gisonaldo Grangeiro, "cearense" de Pernambuco, agrestino do Polo, professor efetivo da Rede Estadual de Educação do Estado do Ceará e da Rede Municipal de Educação de Fortaleza.
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