Um recifense que sempre votou em Arraes, em Lula e Eduardo Campos, me telefona e demonstra estar atônito com a novela em torno de Marília, que tudo indica vai deixar o PT e dividir o campo progressista no Estado.
Logicamente esse conhecido não está sozinho. Muitos pernambucanos estão confusos e discutem exaustivamente as pré-candidaturas ao governo, principalmente nas tais redes sociais.
Marília vai se juntar a direita? A deputada tem um projeto individual e com suas ambições vai prejudicar a esquerda em Pernambuco?
Alguns fazem esses questionamentos, mas para muitos a neta de Miguel Arraes está tomando a atitude correta ao se afastar do PSB e se desligar do PT, que vem rifando seu nome do processo político desde 2018.
Se a parlamentar se aliar a setores da direita no primeiro ou segundo turnos da eleição, não significa necessariamente que abandonou a esquerda.
Seu avô, Miguel Arraes, sempre ganhou eleições compondo com setores conservadores, porém sempre teve o cuidado de manter a hegemonia do campo progressista.
Lula só se elegeu presidente quando escolheu como vice um empresário, atraindo para sua candidatura, em 2002, políticos do centro e da direita.
Este ano, está indo pelo mesmo caminho ao se aliar com Geraldo Alckmin, que possivelmente será seu companheiro de chapa.
Pelo andar da carruagem, na eleição de Pernambuco, este ano, teremos três candidatos com histórico progressista, ligados à esquerda: Danilo Cabral (PSB), Marília Arraes (Solidariedade?) e Raquel Lyra (PSDB).
Sim, não dá para acusar Raquel de ser direitista, pois sua carreira política começou no PSB e virou tucana porque lhe negaram a legenda para disputar a prefeitura de Caruaru, em 2016.
Toda sua família tem um histórico de lutas no campo popular.
João Lyra Filho, o avô, foi prefeito e deputado pelo MDB, nos anos de chumbo.
Fernando Lyra, seu tio, foi um dos nomes mais importantes do MDB autêntico, que combateu a ditadura com firmeza.
Seu pai, João Lyra Neto, também foi do MDB e PMDB, tendo sido vice de Eduardo Campos.
Se Raquel está hoje no PSDB, Danilo e seu partido apoiaram Aécio Neves no segundo turno da eleição de 2014 e votaram a favor do impeachment de Dilma Rousseff em 2016.
O tempo mostrou que foi um erro, que começou a ser corrigido em 2018, quando os socialistas ficaram com Haddad e contra Bolsonaro na eleição de quatro anos atrás.
Este ano o PSB e o PT estão novamente juntos, mas ninguém tem dúvida de que a oposição vai explorar muito o voto de Danilo pelo impeachment, num momento "infeliz da nossa história", como diria Chico Buarque de Hollanda.
Ninguém pode negar, contudo, que Danilo é um bom parlamentar, tem sido coerente ao longo de sua vida, mais de 30 anos no PSB, um partido de tradição, que abrigou políticos respeitados como Pelópidas Silveira, Miguel Arraes e Eduardo Campos.
E o Partido Socialista não é importante somente em Pernambuco. Tornou-se uma legenda forte no Brasil inteiro, elegendo deputados, senadores e governadores, tendo recebido este ano a adesão de políticos de peso, como Flávio Dino, Marcelo Freixo e Geraldo Alckmin, que deve ser o vice de Lula na chapa que disputará a eleição presidencial de outubro.
Assim, o campo progressista está embolado, confuso, mas divisão no campo da esquerda não é nenhuma novidade, nem no Brasil nem no mundo.
A meu ver, os que podem ser caracterizados como de direita, na cena pernambucana atual, são Miguel Coelho, que esteve ligado ao bolsonarismo até pouco tempo atrás e Anderson Ferreira, pré-candidato ao governo filiado ao mesmo partido do presidente da República.
O problema maior da divisão da Frente Popular é que envolve uma briga familiar. Tivemos no processo em curso a oportunidade de acabar com isso, de unir os Campos e Arraes, mas os dois principais representantes dos clãs não ajudaram muito e o senador Humberto Costa em nenhum momento fez papel de bombeiro, muito pelo contrário.
Se tivermos confirmadas as candidaturas de Danilo, Raquel, Anderson, Miguel e Marília fica difícil hoje saber quem vai para o segundo turno.
Uma vitória logo no primeiro turno ficou difícil para qualquer um dos postulantes e se tiver um segundo round entre Danilo e Marília a tendência é a briga se acirrar.
Caso o socialista dispute o segundo turno contra Raquel ou outros dos nomes postos, poderá haver menos turbulência. Vejo condições de união de Marília com a prefeita de Caruaru num segundo turno, mas se ela se aliar com Anderson ou Miguel em algum momento não lhe sobrará nada de coerência e até mesmo seus admiradores não a perdoarão.
Marília é forte, mas lhe falta palanque, o que Danilo tem de sobra.
Raquel também tem densidade eleitoral, mas não vencerá a eleição sem conquistar outras regiões de Pernambuco além da grande Caruaru.
Miguel e Anderson, a meu ver, pela ligação com o bolsonarismo em algum momento de suas trajetórias, tendem a ficar onde estão, com eleitores basicamente na região em que atuam.
O processo não é simples, porém mais na frente o quadro deve clarear um pouco e o eleitor poderá decidir quem é o melhor (ou a melhor) para dirigir os destinos de Pernambuco pelos próximos quatros anos.
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