Nunca
houve exatamente uma "época de ouro" da educação no Brasil. O mantra de
que "no meu tempo a escola era melhor" é uma meia-verdade pois quem
fala faz pensar que antigamente a escola não tinha problema, ou que
esses problemas eram ínfimos.
Nunca
estudei a fundo a história da educação no Brasil mas lembro que nessa
determinada "época de ouro" a escola no Brasil era bem excludente. Haviam exames de admissão em colégios públicos (o
que eliminava grande parte das crianças de 10,11,12 anos da vida
escolar), altos índices de analfabetismo e uma quantidade irrisória da
população terminava o 2º grau (ensino médio). Ou seja, a sala de aula
podia até ser melhorzinha (há controvérsias) mas a sociedade pegava fogo
ao redor dela.
A partir dos anos 1970
começa a expansão do ensino público no Brasil. Os governos militares,
endividados com o FMI, cumpriam com as exigências do fundo quanto a
escolarização simplesmente enchendo as salas de aula, precarizando as
estruturas e ainda mais os salários dos professores. O que se configurou
um desastre na prática era um sucesso em números, daí tome a divulgar
estatísticas frias sobre educação que em nada condiziam com a
realidade.
Essa
cultura de divulgar os feitos da educação apenas em indicadores frios e
estéreis se enraizou. Presidentes, prefeitos e governadores usam de
números, e apenas eles, para fingir que a educação vem dando certo.
Lutar
por um objetivo cujo os efeitos não se verá a olhos nus, e que para ser
percebido é necessário ter uma visão histórico-contextual, é uma tarefa
ingrata. O povão gosta de obra feita, de viaduto construído mesmo que
ele não tenha carro e que o transporte público seja uma porcaria, gosta
de hospital feito mesmo que não tenha médicos ou remédios, quer polícia
na rua mesmo que essa seja truculenta e abuse da autoridade (as vezes
contra o próprio povão). Esse homo vulgaris é fruto de um país
onde a educação é pífia e a concentração de poder e renda nas mãos de
uma minoria é enorme. Percebe-se assim que esse homo vugaris tem
seríssimas dificuldades em aprender aquilo que escape ao seu horizonte
imediato.
Quem
mais sofre com isso é a educação, pois o povo só a enxerga em sua
praticidade imediata, não pelo legado que uma boa ou má educação escolar
deixará para seus filhos e para a sociedade como um todo. Desse modo
se valoriza a letra bonita, o fardamento arrumado, os conhecimentos
decorebas, o domínio das 4 operações básicas e, principalmente, a
capacidade da escola em manter os meninos e meninas trancados e ocupados
durante o dia. Os conteúdos, a pedagogia, a preparação para a vida são
deixadas de lado.
Para
o político basta cumprir com esses anseios imediatistas e a cama está
feita. Daí nasceu uma mentalidade de que importante é manter o aluno
dentro da escola não importando o que ele esteja fazendo por lá. Então
tome aprovação automática, tome falta de livros didáticos, falta de
equipamentos e salários baixos. Tome salas lotadas, tome direcionamento
pedagógico ineficiente, e tome mais deseducação escolar.
Podemos
resumir que o que aconteceu foi que tentou-se acentuar a democratização
do ensino sem promover a estrutura e capacitação para tal.
De
nada adianta democratizar o acesso a escola se não houver antes
condições para que se dê aula. As políticas pedagógicas são permissivas
demais aos alunos, dando-lhes liberdade e proteção excessivas; isso
acaba potencializando os problemas sociais que explodem na escola,
levando boa parte dos jovens ao desrespeito ao espaço escolar, ao
desleixo com os estudos e para a violência verbal e física contra
professores e funcionários da educação. Fora isso há escolas onde faltam
até livros didáticos.
O
que se vê no ensino público são tragédias existenciais sendo escritas.
Não falo apenas daqueles que por falta de oportunidades, necessidades
extremas e influencia de determinadas forças vão cair no crime e no
consumo de drogas; esses casos são minorias ainda que isso não torne
essa face do problema menos calamitosa.. Mas me refiro ao fato de que
estão sendo forjadas gerações que serão incapazes de ler um único livro e
interpretá-lo, que devido a má formação escolar estarão presas aos
sub-empregos, aos trabalhos meramente braçais, que não terão condições
de ascender socialmente pois lhes faltarão a amplitude de pensamento
para construir uma atitude ousada visando o crescimento pessoal.
São essas gerações que devido a estreiteza de pensamento sofrerão as angústias de não encontrar uma palavra que traduza suas dúvidas existenciais
e seus dilemas, que não saberão resolver os problemas de sua comunidade
negociando em conjunto uns com os outros (a pouca escolarização
dificulta muito a convivência com ideias e posturas diferentes).
Provavelmente serão esses indivíduos que mais sofrerão com a violência doméstica, que se refugiarão no alcoolismo, ou cuja única forma de força esteja no fanatismo político ou religioso.
O fracasso da educação pública está construindo a renovação do rol de vítimas dos políticos ficha-sujas, dos líderes religiosos picaretas, dos agiotas inescrupulosos, do traficante aliciador...
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