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quarta-feira, 27 de março de 2013

A INTOLERÃNCIA DOS TOLERANTES

LIBERTÁRIOS OU LIBERTICIDAS? OU: A INTOLERÃNCIA DOS TOLERANTES


DOMINGO, MARÇO 24, 2013

Lá vou eu, pedir para ser crucificado de novo. Já estou de dedo fino de tanto escrever e de tanto ser ser mal-interpretado nesta questão. Mas é o preço a pagar por não seguir a manada e pensar com a própria cabeça. Além do mais, alguém tem que ser o advogado do diabo. Vamos lá.
 
Antes, porém, faço questão de repetir o que já afirmei aqui: é triste constatar que, hoje em dia, questões como "raça", "gênero" e "opção sexual" sejam as únicas causas mobilizadoras capazes de provocar ondas de revolta e retirar as pessoas de seu habitual torpor. Quem tem raça é cachorro, já disse João Ubaldo Ribeiro. Gênero, por sua vez, é uma palavra inventada por feministas para substituir, metafórica e literalmente, o sexo. Quanto a opção sexual, o nome já diz tudo: trata-se de uma opção, uma questão privada, pertencente unicamente à esfera particular. Como tal, deveria fazer tanta diferença quanto gostar de manteiga ou de geléia no café da manhã. Pelo menos é assim que deveria ser.
 
Deveria, mas, infelizmente, cada vez mais se politiza essas questões. Aí está todo o escarcéu dos "militantes" gayzistas por causa de alguns comentários de um pastor evangélico, feitos no Twitter dois anos atrás, e interpretados - erradamente, diga-se - como "racistas" e "homofóbicos" para demonstrar que, no Brasil de hoje, a estupidez virou regra. No país da indignação seletiva, uma alusão bíblica (ainda por cima, equivocada) em uma rede social é motivo para uma insurreição para expulsar o autor das frases da presidência da Comissão de Direitos Humanos da Câmara dos Deputados.
 Em seu lugar, deveria entrar um parlamentar realmente comprometido com a causa dos direitos humanos e das minorias, como o deputado-BBB Jean Wyllys, cujo partido, o PSOL, defende uma ditadura, a dos Castro em Cuba, e tem um terrorista, o italiano Achille Lollo, como um de seus fundadores... Mas isso não causa escândalo, nem gera atos de repúdio, assim como não causa nem um muxoxo a gastança de Dilma e da companheirada no Vaticano, ou o fato de outras comissões do Congresso, como a de Constituição e Justiça e a de Ética, serem integradas, respectivamente, por mensaleiros condenados como José Genoíno e João Paulo Cunha e por aliados de Renan Calheiros.  Tampouco leva às ruas o silêncio indecoroso de Lula da Silva, que já dura mais de 120 dias, sobre as relações nada decorosas de sua "amiga íntima" com o poder. Indignar-se com isso é coisa de moralistas de classe média, decretaram os monopolistas do bom, do belo e do justo...  
 
Se tem uma coisa que a fúria dos gayzistas e simpatizantes contra o pastor Marco Feliciano deixou clara como água benta é que a intolerância mudou de lado e que, definitivamente, "militantes" não sabem o que é democracia. Sim, o deputado Marco Feliciano não é a pessoa mais apropriada para presidir a CDH. Sim, as idéias dele são boçais. Sim, ele explora os fiéis de sua igreja. Tenho, aliás, um motivo a mais para querer vê-lo longe da comissão, pois ele foi para lá conduzido por um conchavo do PT com o PSC (o que mostra, pela enésima vez, que os petistas apenas usam as minorias para alcançar seus objetivos políticos, descartando-as quando deixam de ser politicamente convenientes). Tudo isso é certo. Mas não, senhores. Marco Feliciano não é "racista", muito menos "homofóbico" - é idiota, apenas. 
Quem tiver curiosidade que dê uma olhada no que ele escreveu no Twitter e veja por si mesmo. Dizer"africanos (e não "negros" ou "afrodescendentes") descendem de um ancestral amaldiçoado de Noé" não é racismo: é ignorância, inclusive religiosa. É algo lamentável, ainda mais se tratando de um deputado federal, e se dependesse de meu voto ele não estaria no Congresso, em primeiro lugar. Mas onde está escrito, em que Lei, em que artigo da Constituição, que é crime ser tolo e escrever bobagens no Twitter? (E o vídeo em que ele pede dinheiro dos fiéis?, perguntaria alguém. Respondo lembrando que tal prática não difere no essencial de outros dízimos que existem por aí - o PT que o diga.) 
 
É essa a questão, e que passou despercebida entre tantos abaixo-assinados e atos de repúdio organizados pelo Facebook. Estão linchando um deputado por declarações obscuras no Twitter. E estão usando táticas de quem não dá a mínima para coisas como democracia e direitos humanos. Há alguns dias, um grupo de "militantes" tumultou a sessão da CDH presidida pelo deputado na base do berro e da violência.
 Criaram, assim, um precedente perigoso, com o apoio e a cumplicidade da grande mídia: de agora em diante, qualquer baderneiro poderá interromper a seu bel-prazer uma sessão da Câmara, se não concordar com o que lá se diz. Agiram, assim, como os trogloditas que tentaram calar, também na base do berro e da agressão física, a blogueira dissidente cubana Yoani Sánchez quando da visita desta ao Brasil, no mês passado. "Ah mas foi em nome do bem"... Os gorilas fascistóides que vaiaram e ameaçaram Yoani pensam da mesma maneira.
 

Ainda que Marco Feliciano fosse racista e, vá lá, "homofóbico", a indignação contra ele teria um indisfarçável odor de hipocrisia e de duplo padrão ideológico e moral. Francamente, não vejo diferença nenhuma entre um religioso que faz declarações racistas ou machistas contra negros, mulheres e homossexuais e um militante gay ou feminista que, em nome da tolerância, quer impor sua agenda política à sociedade, às custas da pluralidade. Não vejo diferença entre quem ofende minorias e quem invade igrejas pelado tentando perturbar a missa. Ambos são, para mim, fundamentalmente intolerantes. 
Os últimos são até mais, pois contam com o apoio da maior parte da imprensa e com um discurso hegemônico desonesto construído durante décadas. Este discurso se baseia na auto-vitimização e na demonização de quem pensa diferente, a ponto de tolher qualquer debate. 




Uma coisa é alguém incitar a violência física contra negros, mulheres, gays etc. Isso é crime, e ponto final. Outra coisa, muitíssimo diferente, é simplesmente manifestar uma crença religiosa, ainda que erradamente. Por mais absurda que pareça uma religião, este cidadão que vos escreve defenderá até o fim o direito – e é um direito! – de padres, pastores, rabinos e mulás praticarem seu credo como bem entenderem, desde que não avancem sobre os direitos dos outros (o que está na Lei, não no programa de nenhum partido ou “movimento”). 
 Concordando-se ou não com o que dizem, é um direito deles citar a Biblia, o Talmude ou o Corão, assim como é um direito de gays e lésbicas fazer o que quiserem em suas vidas privadas sem serem importunados. E esses direitos fundamentais de ambas as partes, ao contrário do que dizem muitos militantes, já existem! Felizmente, Estado e religião são, pela Lei, coisas distintas e separadas no Brasil, assim como deve ser o Estado de qualquer “movimento” (assim, pelo menos, espero).

Hoje, no Brasil, quem quer que ouse criticar qualquer demanda do movimento gay, ainda que timidamente, é imediatamente rotulado como “homofóbico”, ainda que ninguém – repito: ninguém – saiba definir exatamente o que seria “homofobia”. Mesmo (ainda) sem Lei alguma que estabeleça o que seria isso, já se pretende impedir que pessoas se manifestem livremente sobre o assunto, pois não estariam fazendo isso de acordo com a cartilha “politicamente correta”. 
A pretexto de coisas como “tipificar o crime de ódio” (francamente, é possível tipificar um sentimento?), o que me parece cada vez mais claro é que se quer separar os cidadãos em categorias com mais e menos direitos. Isso significa acabar, na prática, com a igualdade jurídica. Pior: instituir o delito de opinião. E delito de opinião, meus caros, só existe em ditaduras. E todas as ditaduras são essencialmente más – seja uma ditadura teocrática, seja uma ditadura gay.

Tentar excluir de uma comissão de Direitos Humanos um membro por ser pastor, ou por ter crenças consideradas absurdas, é uma atitude tão intolerante quanto querer obrigar todos a rezarem a Bíblia toda manhã. Se o caso pertence à esfera criminal, não há o que discutir, mas, se é devido à uma opinião considerada "politicamente incorreta", não há como negar o viés ideológico da exclusão. Ninguém está obrigado, por Lei, a não ter preconceitos, tampouco a gostar de quem quer que seja. Até porque, se for para excluir deputados de comissões por suas crenças absurdas, não sobraria um deputado ou senador do PCdoB ou do PSOL no Congresso.

Às vezes é preciso repetir o óbvio: todos são iguais perante a Lei. Esta não distingue entre quem é e quem não é crente, ateu, branco, negro, mulato, índio, hétero, homo, bi ou assexuado. É por esse motivo que a Justiça é representada com uma venda nos olhos: ela é cega para essas questões. Espero que continue a ser.

Sim, Marco Feliciano não me representa. Mas quem disse que gente como Jean Wyllys representa o lado da tolerância e da democracia?

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