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quarta-feira, 6 de abril de 2011

Michel Temer e as propinas do Porto de Santos


O vice-presidente da republica do Brasil, está sendo formalmente acusado de participar de um esquema de propinas nos anos 90, quando presidia a Câmara dos Deputados. Apesar de ter sido elaborado durante a campanha eleitoral do ano passado, a existência do inquérito, procedido no STF, não foi tornado público e os eleitores votaram sem saber que o vice de Dilma estava sob pesada investigação
Foto: Agência Brasil 
Michel Temer jura de pés juntos que não tem nada a ver com isso. Quem acredita?



Há dez anos, na edição de 21 de março de 2001, a Revista Veja publicava uma reportagem que mostrava o então deputado Michel Miguel Elias Temer Lulia, mais conhecido como Michel Temer, do PMDB paulista, atual vice-presidente da República, citado numa acusação de propina, num processo judicial registrado na 3ª Vara de Família e das Sucessões, em São Paulo.

Com a lentidão da justiça e algumas manobras jurídicas dos advogados de Temer, só agora essa história pouco relevante, esquecida do noticiário político e criminal, pousou na mesa do procurador geral da republica, por decisão do Supremo Tribunal Federal. O ministério público irá decidir diante das provas apresentadas se o segundo homem na sucessão presidencial deve ser denunciado como suspeito de corrupção, ativa e passiva, numa distribuição de propina por empresas ligadas ao Porto de Santos na década de 90.

Apesar de aparecer como estrela da investigação, Michel Temer acabou descoberto por vias indiretas e até acidentais.

O processo da 3ª Vara de Família mencionava o nome de Michel Temer à margem do verdadeiro assunto da disputa. A papelada trata de uma separação litigiosa entre Marcelo de Azeredo e Erika Santos, uma estudante de psicologia que tenta, na Justiça, obter uma pensão de 10.000 reais mensais do ex-companheiro.

Com o intuito de provar que Azeredo tinha condições de pagar a pensão, a minuta do processo narra a vida financeira do réu de modo a caracterizá-lo como um homem rico, mesmo ganhando um salário que mal passa da metade da pensão pretendida pela ex-mulher. É aí que ela revela um esquema de propina no porto de que o ex-companheiro se beneficiaria.

Michel Temer aparece como parte de um rateio de propinas arrancadas de empresários que lidavam com o Porto de Santos, no litoral paulista. Segundo a denúncia escrita no processo, a sociedade era formada por Marcelo de Azeredo, que por três anos presidiu a Companhia Docas do Estado de São Paulo (Codesp), entidade responsável pela administração do Porto de Santos, pelo deputado Michel Temer e por uma terceira figura, citada apenas como "um tal de Lima". Há seis planilhas no processo nos quais a divisão do butim é sempre na mesma proporção: 25% para Azeredo, 25% para o tal de Lima e 50% para Michel Temer.

O processo da 3ª Vara de Família menciona o nome de Michel Temer à margem do verdadeiro assunto da disputa. A papelada trata de uma separação litigiosa entre Marcelo de Azeredo e Erika Santos, uma estudante de psicologia que tenta, na Justiça, obter uma pensão de 10.000 reais mensais do ex-companheiro. De início, seus advogados historiam a relação de ambos, de modo a caracterizar que havia entre eles uma "união estável", que durou três anos. Falam de viagens, festas familiares, bilhetes e cartões de juras de amor. Em seguida, com o intuito de provar que Azeredo tem condições de pagar a pensão, a minuta do processo narra a vida financeira do réu de modo a caracterizá-lo como um homem rico, mesmo ganhando um salário que mal passa da metade da pensão pretendida pela ex-mulher. É aí que ela revela um esquema de propina no porto de que o ex-companheiro se beneficiaria.

A ação detalha o suposto esquema de propinas. Diz que a empresa Libra, por exemplo, que ganhou a concessão dos terminais 34 e 35 do Porto de Santos, brindou a tróica com 1,28 milhão de reais. Azeredo ficou com 320.000, o tal Lima com outra parcela do mesmo valor e Michel Temer com 640.000.

Reprodução Revista Veja 
Detalhe de uma das planilhas anexada ao processo

Para se municiar dessas informações, Erika Santos entrou no computador pessoal de Azeredo e copiou as planilhas de controle da divisão do dinheiro. É a cópia dos dados do computador que compõe o anexo.

Lê-se, ali, que as obras civis do terminal de grãos e do terminal ferroviário do Porto de Santos resultaram no pagamento de uma propina assim repartida: 780.000 reais para Azeredo, a mesma quantia para o tal de Lima e 1,56 milhão de reais para Temer. Nessa planilha, Marcelo de Azeredo sempre aparece como "MA", Michel Temer como "MT" e o tal de Lima apenas com um "L".

Em outro negócio, aparentemente relacionado ao lixo do porto, a planilha sugere que se trata de uma propina mensal. No caso, de 26.750 reais para MT e de 13.130 reais para cada um dos outros dois, MA e L. Há uma transação, cuja natureza não é especificada, na qual a empresa Rodrimar desembolsa 600.000 reais. Na lista do computador, consta que Michel Temer ficou com a metade, 300.000 reais, e os outros receberam 150.000 reais cada um. Ao lado das iniciais de Temer, aparece a observação: "+ 200.000 p/ camp", que os advogados, na minuta do processo, afirmam tratar-se de 200.000 reais para a campanha eleitoral do deputado. Essa contribuição não consta da prestação oficial de contas que Temer entregou à Justiça Eleitoral referente ao pleito de 1998.

Na época, o então deputado Michel Temer informou a Veja, que quando soube do conteúdo do processo procurou Azeredo.

"Isso me embaraça", declarou Temer. Em seguida, o deputado disse que não lhe interessava a natureza da relação de Azeredo com Erika, mas que se o assunto viesse a público ele, Temer, entraria com uma queixa-crime contra a mulher. Poucos dias depois Erika Santos comunicou ao juiz da 3ª Vara da Família que estava desistindo do processo, mas para Temer era tarde demais.

Pela lei, sempre que um juiz, no boje de um processo, achar indícios de um outro crime qualquer está obrigado a enviar o material ao Ministério Público, dando continuidade aos procedimentos rotineiros de investigação.

Depois de toda uma saga e encaminhamentos o inquérito preliminar feito pela Polícia Federal acabou chegando ao Supremo Tribunal Federal, em setembro do ano passado, para a realização do inquérito, em virtude do direito de foro privilegiado que dispõem o vice-presidente.

Ao encaminhar o papelório ao STF, a procuradora Federal de Santos, Juliana Mendes Daun diz textualmente que "Temer figura efetivamente como investigado neste apuratório".

Parte disso aconteceu durante a campanha eleitoral. Temer, então Presidente Nacional do PMDB e da Câmara dos Deputados, escolhido para formar chapa com Dilma Rousseff, acabou sendo “eleito” para o segundo cargo mais importante da republica sem que os eleitores soubessem desse seu passado de propineiro de cais do porto.
Foto: Reuters 
Dilma Rousseff e o seu companheiro propineiro Michel Temer, em campanha. Eles se merecem.

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