Do Blog Josias de Souza
Um diplomata herói, o Sabóia; um senador corajoso, o Ferraço; um governo omisso e conivente, o brasileiro
A diplomacia traz o seu estilo no nome: é macia. Muitas vezes, porém, o excesso de punhos de renda faz desandar a receita da marmelada. Foi o que sucedeu no caso do senador boliviano Roger Pinto. Dilma Rousseff concedeu-lhe asilo político. Mas Evo Morales negou-se a emitir o salvo-conduto. O Itamaraty fingia-se de morto havia 455 dias. Até que…
Encarregado de negócios e titular interino da embaixada brasileira em La Paz, Eduardo Saboia resolveu rodar a baiana. Fez isso para interromper o suplício imposto pela inação do Itamaraty ao asilado Roger Pinto. “Eu me sentia como se eu tivesse o DOI CODI ao lado da minha sala de trabalho”, disse.
Responsável pelo planejamento e pela execução do plano de fuga do senador boliviano, Saboia recebera instruções de seus superiores para ficar de bico calado. Moveu os lábios depois de ter o nome mencionado, de forma pouco amistosa, numanota oficial do Itamaraty. Reagiu por meio de entrevista concedida ao repórter Carlos de Lannoy. Abaixo, o trecho veiculado no programa Fantástico, da Globo:
— Assim que o senhor chegou ao Brasil com o senador boliviano, houve um acordo com o Itamaraty para que o senhor não falasse? Sim, houve um pedido. Eu passei o dia inteiro no hotel, quieto. Só que o Itamaraty soltou uma nota mencionando o meu nome. Então, eu decidi também falar com a imprensa e dizer que eu tomei a decisão de conduzir essa operação porque havia um risco iminente à vida e à dignidade de uma pessoa: o senador Roger Pinto, que passou 452 dias [em verdade, foram 455] num cubículo ao lado da minha sala de trabalho.
— Quais eram os riscos que o senador estava sofrendo dentro da embaixada?Havia uma violação constante, crônica de direitos humanos porque não havia perspectiva de saída, não havia uma verdadeira negociação em curso. E ele obviamente tinha um problema de depressão que estava se agravando. Tivemos que chamar um médico. Ele começou a falar de suicídio e dizia constantemente que queria que nós o tirássemos de lá e os advogados dele também dizendo isso. E um quadro que podia degenerar ou em um suicídio ou em risco também para as pessoas que trabalham na embaixada. Eu me sentia como se eu tivesse o DOI CODI ao lado da minha sala de trabalho. É um confinamento prolongado sem perspectivas e sem um verdadeiro emprenho para solucionar. Eu estive em Brasília duas vezes dizendo: ‘olha, a situação está ruim’. Inclusive eu pedi para sair de La Paz porque eu disse: ‘eu não vou compactuar com essa situação que atenta à dignidade da pessoa humana e também à honra do meu país’. Eu não preciso de instructões específicas para situações de urgência. É isso o que aconteceu.
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