Um homem que cometeu um assalto por livre e espontânea vontade será considerado culpado e condenado. Afinal, ele escolheu cometer tal ato. Temos livre arbítrio para escolhermos nossas ações e palavras. Portanto, devemos ser responsabilizados por elas. Se o livre arbítrio é uma ilusão, como sugiro no título, o que faremos com a idéia de culpa? Para sua decepção, não vou abordar o que faremos se removermos a idéia de livre arbítrio. Mas sim, defenderei que o livre arbítrio é mesmo uma ilusão.
Caro leitor, pense em um crime que o chocou profundamente. Um crime no qual você transbordou de revolta e ódio contra o criminoso. Pensou? Pois bem. Agora imagine se você descobrisse que esse criminoso tinha uma grave doença em seu cérebro que o levou a agir assim. Ou seja, se não fosse essa grave doença ele não teria cometido o crime. Você ainda o considera culpado? Talvez você diga: mas por que ele não fez isso ou aquilo com ele mesmo? Ora, pessoas com problemas mentais costumeiramente se matam! Eu te pergunto: uma pessoa resfriada tem culpa por espirrar? Um tuberculoso tem culpa por tossir? Um epiléptico tem culpa por suas convulsões? Uma pessoa com um tumor no cérebro, afetando seus raciocínios e ações, tem culpa por cometer um crime?
Bem, mas uma pessoa doente pode escolher suas ações? Como eu disse, nossos pensamentos e nossas ações provem de nosso cérebro. Isso significa que você não escolhe seus pensamentos e ações. Eles são resultados de eventos cerebrais aos quais você não tem nenhum poder sobre eles. Conversando com um amigo enquanto tomávamos café, ele discordou de mim e citou o seguinte exemplo: Carlos, meu cérebro pode fazer com que eu deseje comer pão, mas eu posso me conter e não comer pão. Eu respondi: seu cérebro pode fazer com que você deseje pão, mas se você resistir e não comer pão é por que seu cérebro fez você desistir do pão. Ou seja, comendo ou não pão, seu cérebro estará por trás de qualquer decisão. Tudo que você fizer ou pensar será resultado de processos físicos em seu cérebro.
O neurocientista Sam Harris, em seu livro Livre Arbítrio nos diz:
“Reflita por um momento sobre o contexto em que sua próxima decisão ocorrerá: você não escolheu seus pais ou a época e o local em que nasceu. Você não escolheu seu sexo ou a maioria de suas experiências de vida. Você não teve controle algum sobre seu genoma ou sobre o desenvolvimento de seu cérebro. E agora seu cérebro está fazendo escolhas com base em crenças e preferências que lhe foram marteladas ao longo de sua vida – por seus genes, seu desenvolvimento físico desde o momento em que foi concebido, e as interações que você teve com outras pessoas, eventos e ideias. Onde está a liberdade nisto? Sim, você é livre para fazer o que quiser agora mesmo. Mas de onde vêm seus desejos?”
Você pode escolher sair de carro ou moto, usar um camisa preta ou branca, comer peixe ou carne, ficar calado ou soltar o verbo. Qualquer escolha que você faça será resultado de processos puramente físicos que ocorreram em seu cérebro. E como você não tem nenhum controle sobre eles, você tem a sensação de ser livre. Mas é apenas uma sensação. Mais uma vez citando Sam Harris:
“O livre-arbítrio é uma ilusão. Simplesmente não somos os criadores de nossas vontades. Pensamentos e intenções emergem de causas de fundo das quais estamos inconscientes e sobre as quais não exercemos nenhum controle consciente. Não possuímos a liberdade que pensamos possuir”.
Estou defendendo criminosos? Nada disso! O que estou tentando mostrar é a fragilidade de nossa crença no livre arbítrio. E não sou o único, adianto. Boa parte dos cientistas há muito tempo consideram o livre arbítrio algo com tanto sentido como um círculo quadrado. Se você pesquisar um pouco encontrará neurocientistas e psicólogos que vêem o livre arbítrio como uma ilusão. Entre eles cito a grande filósofo da mente Daniel Dennet, o psicólogo Paul Bloom, o geneticista Jerry Coyne e o neurocientista Sam Harris.
Eu sei que a idéia que o livre arbítrio é uma ilusão pode parecer incômoda e se chocar com tudo aquilo defendemos e vivemos. Confesso que também me assustei no começo. Claro, sempre há discordância. Existem aqueles que defendem o livre arbítrio, os que defendem o determinismo e os compatibilistas, que defendem que tem como conciliar determinismo e livre arbítrio.
Defendo o determinismo. Mas posso está errado. Não estou reclamando ser dono de nenhuma verdade inquestionável. Minha intenção é levar o leitor a uma reflexão. Espero que tenha tido sucesso.
(Carlos Wilker)
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